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Mandados de segurança para reabertura de estabelecimentos comerciais fechados irregularmente

Atualizado: 27 de jul. de 2020

A pandemia trouxe inúmeras transformações à sociedade. Em um cenário com diversas interferências legais recentes, sobram dúvidas e questionamentos por parte daqueles que foram impactados por essas medidas. Neste contexto, o mandado de segurança pode se revelar como instrumento jurídico adequado para que pessoas físicas e jurídicas recorram ao Poder Judiciário ao sentirem que seus direitos foram violados.

Para disciplinar e regulamentar o isolamento social como medida de controle e prevenção ao avanço do coronavírus, o governo federal editou inúmeras normas e leis com certas restrições e normatizações, a fim de disciplinar o comércio, atividades industriais e empreendedorismo, inclusive autônomos.

Na Portaria MS nº 188, de 3 de fevereiro de 2020, o Ministro de Estado da Saúde declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo Novo Coronavírus. Já a Lei Federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, dispôs sobre medidas para o enfrentamento da citada emergência, e incluiu a quarentena (artigo 2º, II), que abrange a “restrição de atividades” de maneira a evitar possível contaminação ou propagação do vírus.

Essas regulamentações reconheceram e priorizaram o interesse público e de primeira necessidade da população a estabelecimentos como mercados, supermercados, açougues e farmácias. Basicamente, ficaram fora da obrigatoriedade de fechamento em virtude da quarentena, o rol de serviços públicos e atividades essenciais de saúde, alimentação, abastecimento e segurança, de acordo com o Decreto Federal nº 10.282, de 20 de março de 2020.

Considerando essas normas, os executivos estaduais e municipais, por meio da edição de leis, decretos e portarias, puderam adaptar as medidas necessárias às suas localidades, respeitando as particularidades de cada uma. No entanto, interpretações errôneas por parte de agentes de fiscalização podem resultar em intervenções arbitrárias, algumas vezes em sentido contrário àquele pretendido pela própria lei, o que caracteriza violação a direitos líquidos e certos dos comerciantes prejudicados.

São nessas condições que os mandados de segurança cumprem o propósito para o qual eles foram criados.

Continue lendo para entender o que são e como funcionam os mandados de segurança.

Mandados de segurança


Na linguagem jurídica, o mandado de segurança é o remédio constitucional - previsto no artigo 5º, inciso LXIX da Constituição Federal - para solucionar decisões arbitrárias. Sua função é proteger o indivíduo da violação, ou ameaça de violação, dos direitos, exceto aqueles respectivos à liberdade de locomoção e ao acesso à informação própria, protegidos por habeas corpus e habeas data

A Constituição e a Lei 12.016 (que regulamenta o referido instrumento legal) não especificam exatamente quais seriam esses direitos, mas os considera como algo que seria um direito líquido e certo, ou seja, evidentemente existente, sem controvérsia, que dispensa prova e, por estes motivos, pode ser exercido imediatamente.

O mandado de segurança pode ser requisitado por qualquer pessoa física ou jurídica que tenha sido impactada ou ameaçada por atos de ilegalidade ou abuso de poder praticado por autoridade pública ou por agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

Acompanhe, em seguida, dois casos interessantes sobre essas decisões arbitrárias em que os já mencionados instrumentos jurídicos puderam ser usados pela equipe do escritório Ferreira Pinto, Cordeiro, Santos e Maia, com resultados imediatos.

Reabertura de comércios de itens de primeira necessidade, indevidamente fechados


Para reparar os danos ocasionados a comércio de varejista de hortifrutigranjeiros de grande porte, em suas unidades dos municípios de Macaé e Campos do Goytacazes, ambos localizados no estado do Rio de Janeiro, mandados de segurança com pedidos de liminar foram impetrados para restabelecer a verdade dos fatos e dos direitos.

Nos dois casos, os mandados terminaram cumprindo os propósitos a que se destinam, e as decisões judiciais liminares asseguraram o direito do impetrante de reabrir os estabelecimentos que tinham sido irregularmente interditados.

O comércio varejista devidamente estabelecido nos dois municípios, há anos dedica-se principalmente à venda de hortifrutigranjeiros (hortaliças, frutas e legumes), além de carnes, peixes, laticínios, frios, bebidas, pães e itens de confeitaria, entre outros produtos alimentícios.

A natureza das atividades exercidas naqueles estabelecimentos não deixa margem para dúvidas, na medida em que está comprovada pelo estatuto social da empresa, pelo cartão CNPJ de cada estabelecimento e, principalmente, pelos próprios alvarás de funcionamento emitidos pelas prefeituras municipais das cidades onde se localizam.

É importante ressaltar que em virtude da natureza de suas operações (comércio varejista de hortifrutigranjeiros e outros gêneros alimentícios), a atividade da impetrante se enquadra como essencial, estando amparado pelo Decreto Federal nº 10.282 e pela Lei Federal nº 13.979, mencionados anteriormente. Porém, devido à má interpretação, por agentes públicos, do alcance da lei municipal editada em cada um dos municípios para regulamentar o funcionamento dos estabelecimentos comerciais durante o período de calamidade pública, e diante da impossibilidade de reversão administrativa das interdições efetuadas, o Poder Judiciário teve de ser acionado, como antecipamos anteriormente, via mandado de segurança.

Acompanhe abaixo o desenvolvimento dos fatos.

Em Macaé

O Decreto nº 037/2020, editado em 20 de março de 2020 pelo prefeito do

município de Macaé, adotou medidas preventivas para a contenção do coronavírus e determinou o fechamento de determinados tipos de estabelecimentos, tais como shoppings centers, centros comerciais e estabelecimentos congêneres.

No entanto, a mesma norma, ao tratar das exceções, declara que a determinação não se aplicaria aos supermercados, mercados, postos de gasolina, farmácias e serviços de saúde, como hospitais, clínicas, laboratórios e estabelecimentos congêneres, ainda que em funcionamento no interior dos estabelecimentos descritos no respectivo decreto.

Ainda em razão do Decreto nº 037/2020, uma ação civil pública autorizou o Poder

Público a suspender a licença de funcionamento dos estabelecimentos

comerciais que descumprissem as medidas impostas e tomar as medidas necessárias para interdição total ou parcial do local.

Tal autorização levou o serviço de fiscalização do Município de Macaé a fechar o estabelecimento mencionado acima, arbitrariamente. O comércio de hortifrutigranjeiros foi totalmente surpreendido, uma vez que se enquadrava nas normas, sendo um estabelecimento de atividades congêneres às de mercado e supermercado, o que pode ser comprovado pelo seu CNPJ, sendo registrado como comércio de alimentos perecíveis e totalmente indispensáveis às necessidades essenciais da população.

De acordo com o advogado Eduardo Coluccini Cordeiro, sócio do escritório Ferreira Pinto, Cordeiro, Santos e Maia, que defendeu as duas causas, os fiscais de posturas de Macaé não respeitaram o alcance da lei municipal ao interditar o hortifruti, ignorando que a autorização de funcionamento se estendia aos estabelecimentos congêneres. Por “congênere” entende-se aquele que tem o mesmo gênero, espécie, tipo, classe ou função, ou que tem natureza, finalidade ou caráter semelhante ou similar à de outros. “Nesse contexto, resta evidente que não pode prevalecer o ato de interdição praticado pelas autoridades, uma vez que não foi observada a inaplicabilidade prevista no próprio decreto para mercados e estabelecimentos congêneres, como é o caso do hortifruti em questão”, explica Cordeiro.

Ainda segundo o advogado, não foi possível uma solução administrativa diretamente com o Poder Público Municipal, o que culminou com a necessidade de um mandado de segurança - “o instrumento correto para este tipo de situação”. Nesse contexto, a decisão do Poder Judiciário declarou que a interdição foi feita de forma grotescamente ilegal, em desacordo com norma expedida pelo próprio Município de Macaé, motivo pelo qual a liminar foi deferida para assegurar a reabertura do estabelecimento, em benefício do requerente e da própria população de Campos.

Em Campos dos Goytacazes


Já no município de Campos dos Goytacazes, foi editado o Decreto Municipal nº 034, que definiu as regras para funcionamento das atividades comerciais em função da pandemia. Segundo a norma, a partir do dia 25 de março de 2020 os hipermercados, supermercados e mercados, incluindo atacados, atacarejos, lojas de conveniência e afins, somente poderiam funcionar de segunda-feira a sábado, das 8h às 20h, devendo suspender suas atividades aos domingos. Para poder abrir ao público, seria ainda necessário adotar medidas de controle de entrada e saída de clientes, para evitar aglomerações.

O mesmo decreto determinou que as feiras livres, açougues, peixarias, hortifrutigranjeiros, quitandas e centros de abastecimento de alimentos, bem como lojas de conveniência, lojas de venda de alimentação para animais, distribuidores de gás, lojas de venda de água mineral e padarias, estavam autorizados a funcionar diariamente das 7h às 19h.

Controversamente, no primeiro domingo posterior à edição do Decreto Municipal 034, o varejista hortifrutigranjeiro foi surpreendido por fiscais do Município de Campos. Desta vez, foi realizada uma interdição verbal, sob o argumento de que o comércio estava aberto em um dia da semana em que deveria estar fechado, de acordo com o decreto.

Para tentar justificar a interdição efetuada, os agentes fiscais da prefeitura que estiveram no local argumentaram, apenas verbalmente, que o motivo do fechamento seria a constatação de que o estabelecimento estaria vendendo, em um domingo, produtos que somente poderiam ser comercializados de segunda a sábado.

Os funcionários presentes no dia da interdição não concordaram com a interpretação dos fiscais, tendo demonstrado que o espaço da loja que era dedicado à lanchonete já se encontrava fechado e isolado com divisórias há várias semanas, justamente por se tratar de atividade atualmente vedada pela legislação municipal, em razão da pandemia.

Por outro lado, como o artigo 4º do Decreto Municipal estava restringido o funcionamento de supermercados e mercados aos domingos, o hortifrutigranjeiro ainda teve o cuidado de deixar acessível aos clientes, naquele dia, apenas os espaços da loja dedicados à comercialização de verduras, legumes e frutas (hortifruti), carnes (açougue), frutos do mar (peixaria) e padaria, isolando com divisórias, além da lanchonete que já se encontrava fechada, todo o restante da loja.

Para o advogado Eduardo Coluccini Cordeiro, a lisura do varejista pode ser comprovada pelo fato de ele ter adequado totalmente suas instalações às restrições previstas no decreto municipal para comércio aos domingos. “Além disso, a atividade principal do comércio de hortifruti está expressamente enumerada no artigo 5º do decreto, enquanto o argumento utilizado para interdição verbal remete para o artigo 4º daquela norma, que regula o funcionamento de outros tipos de estabelecimentos. Há nítida contradição entre as disposições da lei e a interpretação dada a elas pelos fiscais do município”, destaca.

Mais uma vez, diante da impossibilidade de reversão da interdição pela via administrativa, o mandado de segurança foi impetrado com vistas ao restabelecimento das atividades comerciais do hortifruti aos domingos, desde que respeitado o escopo da lei, conforme vinha fazendo desde a publicação do decreto.

A decisão foi novamente favorável ao impetrante, que pode voltar ao exercício de suas atividades aos domingos, mantendo as restrições parciais em total respeito à determinação da municipalidade.

O advogado Eduardo Coluccini Cordeiro enfatizou que os mandados de segurança impetrados não tiveram como objetivo questionar a correção das leis municipais mencionadas, mas apenas corrigir as atuações dos fiscais que resultaram na interdição indevida das lojas, na medida em que os próprios decretos, quando corretamente interpretados, asseguram esse funcionamento. Tanto é verdade que o Poder Judiciário, em ambos os casos, cuidou de corrigir tais equívocos, até porque o acesso da população a alimentos de qualidade, todos os dias da semana, é essencial para que não haja risco de desabastecimento durante o distanciamento social para controle da pandemia.

SAIBA MAIS

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